quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Sem lar... ninho..

Veio ao mundo para se doar… achava que quanto mais se dava, quanto mais dádivas, mais felicidades . E com suas asas e varinha gastava horas se dedicando as outras pessoas, semeando paz, distribuindo sorrisos, afagando para salvar o outro com a oferta de um abraço, uma palavra, uma esperança ou o simples ficar ao lado. Sim, nasceu para se doar, para ofertar e a tudo e a todos serenar. Voava em todas as direções, ia e vinha… numa eterna viagem de bem querer.
O que ninguém nunca havia imaginado era que durante todos aqueles anos ela usara uma colorida e sorridente máscara, impérvia a dor, a qual tolhia a todos enxergá-la como gente, simplesmente uma pessoa comum, igual a todos. Antes, a viam como uma heroína curadora de todos os males. Uma fada com sua varinha de condão e pó de pirlimpimpim  ou talvez apenas sussurrando supercalifragilisticexpialidocious… e tudo acontecia, como mágica.
Porém a verdade por trás desta linda máscara era que a menina fada chorava muitas e muitas vezes trancada em seu quarto.  Longe da presença de todos e dos dias solitários e frios, ela se despia de suas asas de fada, colocava uma deliciosa e surrada roupa de menina comum e se desfazia em pranto e dor.
Então… muitos anos depois que se viu fada e aprendeu a voar.. viveu um dia de dor e tristeza, um dia forte, sofrimento intenso. Descobriu que havia desaprendido a voar… pior… descobriu que não tinha lar. Parecia que nunca havia voado… que só havia, até então, planado em uma brisa… só…era somente um vento… Estava perdida…E voltou a ter medo. 
E neste momento, junto a essa imensa dor, descobriu também que não havia ninguém para socorrê-la… nunca houve…nem haveria… e chorou sem se importar… nem se esconder..
Olhava tudo a sua volta e não sabia onde estava.  Procurava o mar que sempre fora sua referência e não conseguia encontrá-lo.  No dia que descobriu que não tinha lar, também não sabia como chegara até ali.
O que ela queria, naquele momento, naquele dia, no dia em que descobriu que não tinha um lar, era voltar para casa, mas lembrou-se do que ele um dia falou: 
- Fadas como você, não tem lar. Nunca teve, nunca terá. Não é coisa para você, é para as outras, mas não para você… não…
- mas… sempre sonhei com um lar… um lugar calmo, bom, em paz…
- Fadas nasceram para voar… se doar.. nunca será feliz em um lar…
Enquanto recordava suas palavras, lembrava dos muitos lares que tinha visto, que não eram seus… de muitos que havia sonhado… que também não eram seus… de muitos que havia pensado que fossem… mas não eram seus.
E então chorou… por ela… por todos os lares…. por todos que não tinham um lar… 
Ali ficou, durante dias e noites… lembranças, lagrimas pesavam em suas asas… e continuou no mesmo lugar…
Sabia que não haveria mais outra fada para lhe acompanhar… ela se fora.. ele se fora… ele era seu lar.
De repente sentiu que tinha um oceano… sim… tinha um oceano inteiro dentro dela.  Pensou nos vários NÃOS que a vida lhe colocou no meio do caminho, das várias tentativas inúteis, das sedes insaciáveis, das quedas, dos rombos e principalmente das saudades.
E era nessas horas, que ,não havia ninguém para olhar,  mostrava sua face.  O rosto, sem máscara, da menina-fada sonhadora que foi perdendo o encanto com o passar dos anos. Aquela garotinha que havia sonhado tão alto e que havia desistido de tudo.. e só queria um espaço qualquer, um pequeno ninho, onde pudesse chorar sem medo, sem que ninguém lhe apontasse o dedo e mostrasse suas fragilidades. Ninguém para rir de sua dor.
E ela continuou ali… dias… noites… porém, agora, sem lembranças, sem lágrimas… só a olhar o ar, sentir o sol e a ler o coração.
Um dia, no dia em que descobriu que não tinha lar… ninho.., decidiu que, mesmo que não tivesse ninho, teria seu canto, um lugar só seu, único, aonde pudesse ir sempre, sempre que precisasse ler seu coração.
E este lugar era ali, bem ali onde estava. Não precisava ser necessariamente ali, mas tinha que ser um lugar de frente para o mar, debaixo do céu, ambos bem azuis, com os pés na areia.
Também podia ser como no primeiro dia, ao lado de uma fonte que soprasse sua água para o lado, tamanho o vento, e de frente para um sol branco e gelado, com os pés na neve.
E se nada disso fosse possível, decidiu que seu lugar, que seu canto, seu lar, que seu ninho, estaria dentro de si, iria para onde fosse. E ali, onde estivesse, entraria nele, se sentiria em paz, e leria seu coração.
No seu pior dia, no dia da dor mais sofrida… no dia em que descobriu que não tinha um lar, descobriu tudo isso… e não chorou mais.
E assim, após construir o seu próprio, lar,  seu ninho… voou. Nem se lembra como, mas enquanto definia como seria seu ninho, conforme o descrevia, na praia, na fonte,  na neve, dentro de si, voou.
Respirou profundamente, jogou fora sua máscara, limpou suas asas…  e voou baixo, de forma a ver todos os ninhos que não eram seus, de forma a ver a infinidade de ninhos que podia ter, onde quisesse.
E voou, sim, naquele dia voou… 
E se descobriu… se encontrou… 
Foi assim que ela me contou... e sem mais... voou.


Um comentário:

Tente, invente... comente e me deixe contente.... hahahaha.. Obrigada, volte sempre.... Beijos